Temos uma elite/classe política que se tem perpetuado ciclicamente no poder, diria quase desde tempos imemoriais. Os méritos do 25 de Abril, infelizmente são ensombrados por um quadro jurídico que apesar de apontar no sentido da democracia e da liberdade, as diversas praxis governativas têm-nos remetido para uma espécie de moldura muito castiça, mas pouco consequente. Assiste-se a este paradoxo, Portugal é um Estado de Direito formal, porém ainda não é na plenitude um Estado de Direito material.
Tendencialmente as elites políticas renovam-se sempre se deixam ultrapassar pelos acontecimentos ou factores ambientais. De igual forma, não podemos negar que a cultura de casta impõe aos novos membros velhos vícios. Seria de esperar que os novos membros, vindos de espaços políticos divergentes do status quo, trariam posturas renovadas, todavia amiúde assiste-se à substituição dos ideais pelas benesses do poder, subjugando o bem comum aos conflitos de interesses gerados.
Actualmente assiste-se a uma aceitação quase irracional, do exercício do poder por entidades mais ou menos conhecidas, que sucessivamente se mascaram atrás dos eleitos por todos, dando à política uma valoração excessivamente maquiavelista, logo de um racionalismo atroz direccionado para a gestão de interesses de minorias.
Verifica-se que a cidadania se tem reduzido a esse jogo eleitoral de alternância das elites, permitindo-nos que as escolhas recaiam sobre aquele que um qualquer publicitário nos apresente como sendo o mais engraçado.
As escolhas que engrossam a ignorância visível na escrita, mas também na rendição ao prazer em detrimento da utilidade racional - o hipermercado ao invés do museu; o programa de televisão cor-de-rosa ao invés do cultural ou do livro; a produção de uva para vinho ao invés da produção de cereais para pão, o deixar andar em detrimento de abnegada disciplina – amiúde surgem do seio da chamada "classe média" (desculpem-me os sociólogos, pela imprecisão). Esta, consegue aceder a recursos educativos que lhe propiciam capacidade de intervenção política. Contudo, este grupo tem sido remetido a uma dimensão próxima do grupo dos desprovidos. Porque será? E porque assiste a "classe média" a tudo isto sem reagir?
Porque insistimos em fazer as escolhas erradas? Porque não planeamos/projectamos?
O pessimismo aliado ao fatalismo lusitano pode colocar-nos em situação de difícil retorno.
Não por mero revisionismo, mas para que reconheçamos de que somos feitos, deveríamos dedicar mais atenção ao ADN que carregamos.
É verdade que os nórdicos estão economicamente à nossa frente e que os "nuestros hermanos" começaram o caminho da democracia social ao mesmo tempo que nós, todavia terão sabido agarrar melhor as oportunidades que lhes apareceram.
Contudo, não é menos verdade, que fomos nós que descobrimos novos mundos, que abolimos a escravatura e a pena de morte em primeiro plano, fomos nós que fizemos os primeiros acórdãos entre "Estados" (ingleses, povos indianos, chineses, japoneses, ...) e... não menos importante só com este "rectangulozinho" e os filhos que a terra deu, já cá andamos vai para 9 séculos.
Não será tempo de elevarmos as nossas cabeças, utilizá-las e deixarmos que os outros nos admirem, não pelas nossas praias, não pelos golos marcados, mas sim por aquilo que somos realmente?
Para tudo isto é preciso que com a necessária educação, deixemos os medos seculares que nos afligem, vençamos os novos Adamastores e voltemos a relegar os “Velhos do Restelo”.
Em suma, não precisamos de nos construirmos como indivíduos firmes em convicções, mas tolerantes nas acções e deixarmos de nos alienarmos de participar na vida colectiva.
A alienação é imputável aos políticos que se deixam absorver pelos ritos oligárquicos, como àqueles que lhes delegam o poder sem que se façam ouvir.
Em última instância, poder-se-á ter de rever o conceito de democracia, pois importa não reduzi-la às funções legisladora, executiva e jurisdicional, para depois se revelar inútil.
Este é o tempo em que urge promover a qualidade do trabalho produzido, as condições em que se produz, a participação associativa mais ou menos estruturada, o civismo com que trocamos opiniões e nos dirigimos uns aos outros, é tempo da cidadania e da objecção de consciência, seja num plano individual, seja num exercício colectivo.
Ao invés, de esperarmos que alguém empurre a carroça por nós, importa que nos cheguemos à frente e pensemos como fazê-lo e em conjunto empurrar então a bem dita da carroça.
07/Janeiro/2015
Paulo Bernardo e Sousa
Politólogo
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